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Os Sonhos e o Aparelho Psíquico



Não é de hoje que o ser humano se sente intrigado com os sonhos, principalmente quando estes são perturbadores ou em um certo ponto de vista, aterrorizantes.

Há séculos os sábios e entendidos em magia e ocultismo vêm estudando e prognosticando fatos baseados em sonhos e “visões” porém somente depois de Freud foi que o estudo dos sonhos começou a ser levado á sério como uma ciência e não como algo esotérico e supersticioso.

Há um caso em um dos livros da Bíblia que narra o quão perturbado um Faraó do Egito se sentiu ao ver sete vacas magras saindo do rio Nilo, no qual devoravam as sete vacas gordas que haviam saído anteriormente. Não houve sequer um sábio em todo o território egípcio que pudesse desvendar o misterioso sonho do Rei. Foi então que alguém que havia passado um tempo na prisão com um jovem Hebreu, lembrou ao Faraó que este jovem um dia teria “interpretado” o seu sonho no qual haveria este de ser restituído ao seu cargo junto ao trono.

O faraó manda então chamar este jovem e conta a ele o seu sonho. O jovem escuta e diz ao Faraó que o seu Deus o ajudaria a dar entendimento à ele. Este jovem diz que as sete vacas gordas eram períodos de abundância enquanto as outras sete vacas magras que vieram e devoraram as sete vacas gordas eram os anos de fome e escassez.

O Faraó se impressiona com a habilidade do jovem e pergunta a ele o que ele achava que deveria ser feito. O jovem muito sabiamente porém logicamente, pede ao governante que inicie um plano de estoque e conservação das sementes e grãos para que possam alimentar o povo e ainda servir de moeda de troca entre as nações que viriam em busca de ajuda.

O governante não somente gosta da sugestão bem como dá ao jovem Hebreu o cargo de governador e encarregado de executar o plano. Eu poderia escrever um belo capítulo desta história e encher as páginas deste trabalho com infindas analogias porém quero me atentar à lógica da analise.

E se o jovem hebreu tivesse conhecido Freud?

Podemos perceber que assim como o Faraó do Egito que tinha em seu inconsciente um universo particular, cada um de nós carrega dentro do aparelho psíquico um universo totalmente à nosso modo de ver, assimilar, entender e perceber o mundo.

Para os egípcios da época o grandioso Rio Nilo era fonte de vida, sustento e diversão. Toda a irrigação do terreno seco em meio à um clima árido era feito através do Nilo. Quanto as vacas que têm o seu período de gestação em 285 dias representa desta maneira quase um ano no nosso calendário Gregoriano. O que talvez fosse o período de um ano para os egípcios.

Além disso as vacas também são símbolos de sustento pois delas provém o leite no qual seres humanos vêm consumindo há muitos e muitos anos.

Vemos então que o sonho do Faraó é cheio de simbolismo ou representação, o que faz a gente pensar que a formação psíquica do faraó está baseada e arraigada aos valores de seu povo e sua cultura. Na verdade o sonho do governante revela uma preocupação latente de algo ruim que poderia acontecer pois a dinastia egípcia era feita de pai para filho. Além disso, vale a pena lembrar que as histórias de fome naquela região eram cíclicas e havia, portanto um medo latente em cada cidadão de um período de seca e escassez.

Embora o jovem Hebreu tenha dito que o seu Deus haveria de “revelar” o sonho, hoje está obvio para nós que o sonho do Faraó está cheio de figuras porém para um jovem hebreu talvez, não fosse tão fácil assim interpretar um sonho tão peculiar. Mas mesmo assim creio que ao passar dos anos tendo o jovem estado um tempo como escravo deste povo, pôde inconscientemente perceber seus valores e crenças e não duvido muito que até tenha aprendido os costumes daquele povo e os incorporado no modo de vida

Está claro que a necessidade básica de sobrevivência nos tempos primordiais, nos leva a crer que este sonho tem uma forte evidência de uma pulsão de auto conservação. Assim como um bebê que busca pelo calor do corpo da mãe e seu leite, talvez o Faraó tenha tido a necessidade de amparo, dando assim a entender a associação com a figura da vaca como sendo um tipo de mãe.

Segundo Freud, interpretar um sonho significa atribuir à ele um sentido e desvendar a imagem real da situação como se fora as peças de um quebra cabeças sendo postas e finalmente tendo a total compreensão do que o inconsciente percebera.

Sendo o sonho do Faraó um processo somático e não um ato mental, percebemos que seu sonho possui todos os elementos da sua própria experiência como governante e cidadão do Egito com sua história e bagagem cultural, religiosa e social.

Concluo declarando que acredito que toda e qualquer tentativa de dar aos sonhos outro sentido que não seja racional e baseado na própria percepção de mundo e sociedade do indivíduo, será uma mera tentativa de especular e usar de superstição para manipular o sonhador.


Por: Getulio Tamid - Psicanalista, Educador Social e Pós Graduando em Antropologia e Neuropsicopedagogia Clínica e Institucional.

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