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"Babygirl": O Conflito das pulsões e os destinos da alma no cinema contemporâneo

Foto do escritor: Getulio TamidGetulio Tamid

Atualizado: 12 de jan.


Nicole Kidman em Babygirl

O filme "Babygirl", dirigido por Halina Reijn, surge como um fascinante estudo cinematográfico das dinâmicas humanas. Mais do que um thriller erótico, o longa-metragem aborda questões psicológicas profundas, tangenciando a teoria psicanalítica de Freud sobre as pulsões e seus destinos.


Freud postulou que as pulsões, forças energéticas que moldam o comportamento humano, são inerentemente ambivalentes. Podem ser orientadas para a vida (Eros), promovendo ligação, criação e prazer, ou para a morte (Thanatos), buscando destruição, ruptura e liberação. Em "Babygirl", esses conceitos estão intrinsecamente entrelaçados na jornada emocional da protagonista, Romy, interpretada magistralmente por Nicole Kidman.


A Pulsão de Vida e o Desejo pela Conexão

Romy é apresentada como uma mulher em controle absoluto, tanto em sua carreira como CEO de uma empresa de tecnologia quanto em sua vida pessoal, aparentemente estável. Essa fachada de completude esconde, no entanto, uma fome interna, um desejo por algo que ultrapassa as fronteiras do previsível. A cena inicial, na qual ela experimenta prazer com o marido, mas termina de forma surpreendentemente desconfortável, sugere que as pulsões de vida dela estão limitadas por barreiras invisíveis.

Quando Samuel, o jovem estagiário, entra em cena, algo dentro de Romy começa a se descolar do conformismo. A relação entre eles transcende a mera atração sexual: é uma busca por uma comunicação plena, por um espaço onde suas pulsões possam ser canalizadas de maneira genuína. Aqui, vemos a pulsão de vida operando como uma força que não apenas une, mas também desafia.


Thanatos: A ruptura e o prazer no descontrole

O pastor alemão descontrolado em frente ao escritório de Romy simboliza o que Freud chamava de pulsão de morte: um impulso caótico, que busca libertar-se das amarras e da repressão. Romy, ao observar o controle que Samuel exerce sobre o animal, percebe nele uma capacidade única de domesticar o indomável. Isso reflete seu próprio desejo inconsciente: entregar-se ao descontrole de forma controlada.

Esse desejo, no entanto, não é simples. Como Freud apontou, a pulsão de morte frequentemente se manifesta de maneira ambivalente, podendo tanto ser direcionada contra si quanto contra o outro. No caso de Romy, sua entrega a Samuel é ao mesmo tempo um ato de destruição do seu eu rígido e uma tentativa de renascimento através da conexão.


Os destinos da pulsão: Submissão ou liberdade?

Freud também destacou que as pulsões podem ser desviadas, reprimidas ou sublimadas. Em "Babygirl", Romy transita entre esses destinos de maneira magistralmente complexa. Sua interação com Samuel poderia ser vista como uma forma de sublimação, na qual ela encontra um espaço para experimentar sua vulnerabilidade sem perder completamente o controle.

No entanto, a dinâmica de poder entre eles é ambígua. Romy cede o controle de maneira consciente, em um ato que poderia ser interpretado como submissão voluntária. Mas essa submissão, longe de ser uma fraqueza, é retratada como uma escolha poderosa – um exercício de liberdade em sua forma mais paradoxal.


Seria uma relação de narcisista e codependente ?


O filme não deixa claro e evidente que isso está acontecendo porém como em todas as relações onde há o conflito de controle/poder e submissão, podemos dizer que em um cenário real, afirmaríamos que é muito comum que o narcisista patológico seja como o estagiário Samuel. Ele sabe muito bem onde estão as fraquezas e vulnerabilidades de Romy bem como aquilo que dá a ela intenso prazer. Além disso, ele sabe manipular e usar muito bem a tática da triangulação e isso acaba fazendo parte do jogo da sedução.


A Cena Final: O espelho da condição humana

A última cena, que espelha a primeira, encapsula a tragédia do destino humano. Por mais que tentemos escapar dos papéis impostos, somos constantemente empurrados de volta a eles. A decisão de Romy no final do filme é carregada de tristeza, mas também de aceitação. Freud diria que essa é a tensão inerente à vida psíquica: o desejo de liberdade e a inevitabilidade das restrições.


"Babygirl" como Psicanálise cinematográfica

Halina Reijn constrói um filme que, mais do que narrar uma história, investiga os meandros das relações humanas e das forças inconscientes que as impulsionam. É uma obra que dialoga diretamente com a teoria freudiana, mostrando como as pulsões de vida e morte, e os destinos que damos a elas, moldam nossas escolhas e relações.

Assim como na psicanálise, em "Babygirl" não há julgamentos definitivos, mas sim um convite à reflexão. O que fazemos com nossas pulsões? Sublimamos, reprimimos ou nos permitimos vivê-las plenamente? Essas são perguntas que o filme deixa ecoando, muito além dos créditos finais.

Por fim, "Babygirl" nos lembra que, no cinema ou na vida, as histórias mais fascinantes são aquelas que ousam olhar para o abismo de nossa psique – e não desviar o olhar.


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